quarta-feira, 16 de abril de 2025

Al Berto

Tenho o olhar preso aos ângulos escuros da casa
tento descobrir um cruzar de linhas misteriosas, e
com elas quero construir um templo em forma de ilha
ou de mãos disponíveis para o amor....

na verdade, estou derrubado
sobre a mesa em fórmica suja duma taberna verde,
não sei onde
procuro as aves recolhidas na tontura da noite
embriagado entrelaço os dedos
possuo os insectos duros como unhas dilacerando
os rostos brancos das casas abandonadas, á beira mar...

dizem que ao possuir tudo isto
poderia Ter sido um homem feliz, que tem por defeito
interrogar-se acerca da melancolia das mãos....
...esta memória lamina incansável

um cigarro
outro cigarro vai certamente acalmar-me
....que sei eu sobre as tempestades do sangue?
E da água?
no fundo, só amo o lodo escondido das ilhas...

amanheço dolorosamente, escrevo aquilo que posso
estou imóvel, a luz atravessa-me como um sismo
hoje, vou correr à velocidade da minha solidão
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Al Berto 
Degredo no Sul

quarta-feira, 2 de abril de 2025

Lya Luft

 COMPOSIÇÃO 

Quando perdi quase tudo,
descobri que a dor
não era maior que o sonho.
Quando esqueci o caminho,
vi que o horizonte 
ficava do lado errado.
Quando só o meu rosto
sobrava em cada espelho 
(e nada do lado de cá),
juntei desalento e desejo
e me reinventei
com carinho.

(Agora pareço comigo 
antes de o amor ser
cancelado.)
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Lya Luft
Para não dizer adeus