quarta-feira, 27 de março de 2024

Priscila Rôde

DO QUE ME IMPORTA

Eu queria muito que você estivesse aqui agora.
Queria muito que você resolvesse a minha memória
Que, se não distraída, me lembra.

Não é tarde para o que sinto.
Não há tempo certo para a vertigem.
Há o tempo inteiro. Há a palavra
E o desapego.

Saudade é um fragmento nosso
Procurando encaixe. Há quem ache.
Eu estou sempre sentindo falta.
Estou sempre sobrando dentro de mim.

Tudo o que não passa, me devora.
Ainda há muito de nós
Em tudo o que me importa.
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Priscila Rôde
Para que fiques

quarta-feira, 20 de março de 2024

Ana Martins Marques

O que eu sei?

Sei poucas coisas sei que ler
é uma coreografia
que concentrar-se é distrair-se
sei que primeiro se ama um nome sei
que o que se ama no amor é o nome do amor
sei poucas coisas esqueço rápido as coisas
que sei sei que esquecer é musical
sei que o que aprendi do mar não foi o mar
que só a morte ensina o que ela ensina
sei que é um mundo de medo de vizinhança
de sono de animais de medo
sei que as forças do convívio sobrevivem no tempo
apagando-se porém
sei que a desistência resiste
que esperar é violento
sei que a intimidade é o nome que se dá
a uma infinita distância
sei poucas coisas
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Ana Martins Marques
O livro das semelhanças 

quarta-feira, 13 de março de 2024

André Oviedo

COMO SE PORTÁSSEMOS MEDALHAS

nossa postura se parece
o pescoço projetado à frente
com a elegância
que descreveu Leminski
andamos mais adiante
não como dois atrasados
mas como os velocistas
que se esticam um pouco mais
ao cruzar a linha de chegada
e embora a inclinação do corpo
se pareça muito
com o início de uma queda
é a representação definitiva
de quem decidiu continuar
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André Oviedo
Estar perto de perceber alguma coisa

quarta-feira, 6 de março de 2024

Mariana Rozario

 MOMENTO

Se eu escrever sobre você um poema
você vai querer saber?
Agora, o poema ainda quente e úmido
Ou dez anos atrás
um poema seco e fresco?
Você quer o poema agora,
imprevisível e apaixonado
Ou o poema duro e áspero
carcomido pelas páginas da certeza?
Você quer o poema desesperado,
escrito enquanto ainda te apertava
sem saber se ainda apertaria?
Ou você quer o poema polido,
revisado, perfeito,
metricamente desenhado
para camuflar aquele desespero
de não saber se haveria poema
para descrever o desespero
de finalmente saber e ter
como teria querido
para todo o sempre
mesmo sem ter sabido?

Pense nisso.
Mas só se eu escrever um poema sobre você.
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Mariana Rozario
Poemas para aquilo que todo mundo quer